Conversei com Tom Farias, autor do livro "Toda fúria"

Gutinha - Publicado na categoria Entrevistas em 17/07/2023


Chegou a hora de vocês conhecerem Caniço, um garoto inteligente, carismático e totalmente cooptado por um sistema que sentencia tantos jovens à marginalidade. Criado nas ruas do Rio de Janeiro, é mais um sobrevivente em um mundo que nunca o quis vivo. Seu desprezo pelo perigo chama a atenção de líderes corruptos, que o exploram em benefício próprio, e de chefes do tráfico, que lhe oferecem a oportunidade de se fazer no crime.

Toda fúria é um relato cru e brutal que lança luz sobre questões fundamentais da negritude e de vidas periféricas, destrinchando uma realidade feroz onde impera a lei do mais forte.


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Quem escreve essa história que nos transforma quando chegamos ao seu final é Tom Farias, autor carioca que acaba de integrar meu maravilhoso time e que carrega um currículo de peso. Dentre seus livros publicados destacam-se as afrobiografias Cruz e Sousa: Dante negro do Brasil, finalista do prêmio Jabuti 2009, e Carolina: uma biografia, finalista do Jabuti 2019 e ganhadora do prêmio Flup do mesmo ano. Membro efetivo da Academia Carioca de Letras, é crítico literário do jornal O Globo e colunista da Folha de S.Paulo. Na comunidade de Manguinhos, no Rio de Janeiro, uma biblioteca comunitária foi batizada em sua homenagem. Em São Paulo, também atua como embaixador do Instituto Adus em prol de refugiados africanos.

Compartilho com vocês o bate-papo com o autor para que o conheçam melhor:

Gutinha: Como a literatura entrou na sua vida? Você sempre gostou de ler desde pequeno?

Tom Farias: A literatura está na minha vida desde menino. Primeiro, lendo textos avulsos e poemas; em seguida, os chamados clássicos – Machado, Alencar, Lima Barreto, Augusto dos Anjos, Camões, entre outros.

Perdi meu pai aos 10 anos, e o processo de luto me levou a uma espécie de solidão, uma orfandade voluntária que acabou encontrando nos livros uma forma de acolhimento. Meu pai deixou alguns livros desses autores citados, além de enciclopédias, dicionários etc. Eu, nessa fase de solidão e orfandade, acabei mergulhando nesses autores, nos quais encontrei um mundo novo através de histórias fantásticas que muito me impressionaram. Daí para a escrita foi um passo.

Eu me tornei escritor muito menino – lembro que minha estreia no jornalismo, sendo pago para escrever matéria, data dos 14 anos. Ainda tenho textos escritos desde os 13 anos. Datam dessa época os meus primeiros rascunhos de contos e diários.

Gutinha: Quais são os autores e as obras que mais inspiraram a sua trajetória?

Tom Farias: Na infância e juventude, os clássicos. Fui um aluno aplicado. Cheguei a saber O Ateneu, de Raul Pompéia, de cor, citando longos períodos. Sabia também de cor as poesias de Camões, de Gregório de Matos e, sobretudo, de Augusto dos Anjos.

Quando, em sala de aula, a professora pedia aos colegas de classe para ler trechos de algum livro de Machado, Alencar e outros, eu já os sabia porque tinha, aos 15 anos, lido tudo de Machado, Alencar, Lima Barreto, muita coisa de Joaquim Manuel de Macedo, além dos estrangeiros – de Agatha Christie a Dostoiévski.

Gutinha: Seu trabalho de resgate às figuras para a história, a cultura e a literatura afro-brasileiras é imenso e de extrema relevância. Em paralelo, você se dedica a escrever obras de ficção. Qual foi a inspiração para escrever Toda fúria?

Tom Farias: Eu sempre tive, para os trabalhos de grande fôlego, o que chamo de respiro. Toda fúria e outros trabalhos já publicados, como os romances Os crimes do rio vermelho (2001) e A bolha (2021), fazem parte deste processo. Gosto muito, no entanto, de escrever biografias, que chamo de afrobiografias, pelas quais já ganhei seis prêmios e fui duas vezes finalista do Jabuti – em 2009 e 2019.

Toda fúria está orbitando em mim desde 2007, quando tratei de sua primeira redação. Nos anos seguintes, fui redefinindo o texto, escrevendo partes e acrescentando, como uma atualização, coisas aqui e ali. Na verdade, a inspiração é a crônica do dia a dia, o caos social, o desajuste ao qual a sociedade vai empurrando o país, além do desamparo da juventude, inserida nas negociatas públicas, fulcro da ação dos maus políticos e da falta de políticas públicas, seja na área da educação ou da saúde.

Gutinha: Qual mensagem você gostaria de transmitir aos leitores deste livro?

Tom Farias: Este livro é um alerta dos novos tempos ao alcance de um outro, mais promissor, um horizonte de futuro. A vida está muito barateada – e a carne mais barata do mercado é a negra, como já profetizava a grande Elza Soares. Penso que possa ajudar a refletir sobre a condução que queremos dar ao mundo e o sentido de humanidade que pretendemos transmitir às novas gerações – uma geração que precisa estar na linha de frente no combate ao racismo e à desigualdade social que chancela um abismo para as questões de gênero e as chamadas minorias.

Depois que lerem, me contem no Instagram, Twitter ou TikTok o que acharam!

Um beijo,
Gutinha

Tags:  Editora Gutenberg,  Literatura Nacional,  lançamentos


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