Os desafios e as alegrias da tradução por Silvia Massimini Felix

Silvia Massimini Felix - Publicado na categoria Entrevistas em 11/10/2023


Silvia Massimini Felix é formada em Língua e Literatura Espanhola e Italiana pela Universidade de São Paulo, e mestre em Literatura Espanhola pela mesma instituição, com uma dissertação cujo objetivo foi traduzir e analisar duas novelas exemplares de Cervantes.


Ela trabalha como tradutora de espanhol e italiano e preparadora de textos para diversas editoras. Nos últimos anos, vem se dedicando à tradução de escritoras contemporâneas latino-americanas, como a equatoriana Mónica Ojeda, autora de Mandíbula e Voladoras, e a mexicana Cristina Rivera Garza, que assina O invencível verão de Liliana, títulos publicados pela Autêntica Contemporânea.


Nesta entrevista, que faz parte da campanha Traduzir Mundos, que tem o objetivo de destacar e valorizar o ofício do tradutor, Silvia compartilha detalhes de sua rotina e o seu sentimento afetuoso em relação à tradução. Confira:


Quando você começou a traduzir e como escolheu essa profissão?

Comecei a me interessar por tradução literária durante a graduação da faculdade de língua espanhola, e, terminada a faculdade (2001), uni dois grandes interesses – literatura e tradução – e dei prosseguimento aos estudos no mestrado em literatura, em que me debrucei sobre a tradução de duas novelas exemplares de Cervantes, O casamento enganoso e O colóquio dos cães. A partir do instante em que comecei a estudar mais sobre tradução e a me envolver com o texto trabalhado, cada vez fui me apaixonando mais por todo o processo tradutório e encontrei aquilo a que realmente gostaria de me dedicar como profissão.


Qual livro representou o maior desafio para você e por quê?

Acredito que todas as obras traduzidas apresentam, em maior ou menor grau, algum tipo de desafio: recriar na nossa língua um texto escrito em outra – às vezes de uma época e cultura bem distantes da nossa – requer um exercício de deslocamento em direção ao outro, ao desconhecido, e este é um processo desafiador e ao mesmo tempo enriquecedor. Os livros que mais me desafiaram, e desafiam, nessa trajetória tradutória são aqueles que trabalham intensamente a linguagem e a estrutura narrativa, obras que não pensam apenas em contar uma história, mas também em como contarão essa história. Um grande desafio de tradução para mim foi o livro Museu do romance da Eterna, do argentino Macedonio Fernández, uma obra em grande medida experimental, justamente por esse intenso trabalho formal e linguístico.


O que te dá mais alegria em uma tradução?

Acho que a jornada da tradução em si, o percurso que vamos fazendo desse ponto de partida que é o texto original para chegar a uma nova criação na nossa língua. É muito gratificante ir construindo, ou reconstruindo, uma história e chegar ao final dela com a sensação de “dever cumprido”, de ter conseguido recriar, com nossas palavras, um texto o mais próximo possível do original.


Qual é seu processo de trabalho?

É um processo um tanto caótico (um caótico organizado, eu diria!). Raras vezes leio todo o livro que irei traduzir antes de começar a tradução propriamente; gosto das surpresas que o livro vai me apresentando. Minha primeira versão, portanto, é sempre muito falha e cheia de lacunas e marcações. Depois dessa primeira versão do trabalho, vem a parte de lapidação do texto: a segunda e terceira leituras para chegar a um resultado o mais satisfatório possível.


Você lê o livro traduzido depois de publicado? Você já se deparou com algum erro ou escolha que considerou inadequada depois de um tempo?

Confesso que quase nunca leio minhas traduções depois de publicadas, acho um sofrimento porque sempre encontro algo que me desagrada e penso: “Nossa, poderia ter escrito assim ou assado, onde eu estava com a cabeça?”. Eram escolhas que faziam sentido no momento daquela tradução e que podem mudar, já que somos seres sempre em constante mudança. Por isso, é raro que eu leia de novo o texto todo depois que minha tradução foi publicada.


Qual é o seu sentimento em relação à tradução? O que você deseja para os profissionais desta área?

Sinto um imenso amor pela tradução; acredito que é um dos processos mais interessantes e apaixonantes que há. Às vezes não nos damos conta, ao ler um livro, o intenso trabalho cognitivo, de pesquisa e exploração que é exigido do tradutor ao reescrever um texto. Meu desejo para todos os profissionais da tradução é que nosso ofício seja sempre mais reconhecido, que a atividade seja cada vez mais valorizada e bem remunerada.

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