Grupo Autêntica

Fique por dentro do Grupo Autêntica

  • Notícias
  • Press Kit (Releases)
  • Saiu na Imprensa
  • Eventos
  • Contato
    (exclusivo para imprensa):

Tradução é destaque no jornal Estado de São Paulo

15/09/2008 — Francisco Quinteiro Pires, para O Estado de São Paulo

O espanhol Josep M. Esquirol propõe nova ética para a era da ciência e da tecnologia no ensaio O Respeito ou O Olhar Atento

Os consumidores de produtos tecnológicos sabem que, no momento mesmo da compra, terão adquirido uma tecnologia defasada. Mas isso não os impede de tratar as coisas – e as pessoas – de modo automático. Eles precisam ter o último lançamento do mercado, apesar de muitas vezes não entenderem por quê.

Um dos resultados dessa atitude é a indiferença, que não tem nada a ver com o silêncio e a solidão, cada vez mais desconcertantes para o homem atual. Outro é a incapacidade de admiração autêntica diante das coisas da realidade. Platão e Aristóteles entendiam o ato de filosofar como efeito do ato de admirar-se. E diziam ser o espanto diante dos fenômenos o caminho para o conhecimento.

Ignorar o mundo ao redor para seguir modelos de conduta de modo acrítico, embora seja cômodo, é faltar com o respeito. Essa é a constatação do novo estudo do filósofo espanhol Josep M. Esquirol. O Respeito ou O Olhar Atento (Autêntica, 152 págs., R$ 32), traduzido por Cristina Antunes, propõe uma ética para a era da ciência e da tecnologia, marcada pelo desequilíbrio e pela superficialidade.

A noção de respeito é como a de liberdade, todos sabem do que se trata, mas ninguém sabe explicá-la. Respeitar, lembra Esquirol, deriva do verbo latino respicere: olhar atrás, tornar a olhar. O respeito, ele explica, se realiza na descoberta da distância justa em relação às coisas para melhor entendê-las.

Hoje as pessoas transitam entre dois extremos: a indiferença (distância total) ou o consumo (supressão da distância). Os indivíduos portam-se como se fossem unidades fechadas, apesar de Esquirol – como se estivesse repetindo versos do poeta Vinicius de Moraes – afirmar que a vida só se dá a quem se deu. Tanto é que, depois de escrever O Respeito ou O Olhar Atento, o filósofo está às voltas com a noção de tempo, tão cara a uma sociedade técnico-científica, que o concebe como se ele tivesse apenas uma dimensão – quantitativa e homogênea.

É preciso exercitar uma visão mais complexa sobre a realidade. Pois o mais escravo dos homens sempre é aquele que nem deseja saber o que é. Na entrevista a seguir, Josep M. Esquirol propõe o desafio da “ética do respeito” a uma humanidade que corre o risco de destruir a si mesma se não parar para refletir com responsabilidade.

OLHAR DUAS VEZES

A origem do meu estudo nasce da seguinte evidência: atenção e respeito são essencialmente a mesma coisa. Prestar atenção não significa somente intensificar a nossa percepção e a nossa capacidade cognoscitiva, mas também um despertar e uma vigília do nosso sentido moral. A idéia é que, se prestarmos atenção nos outros e nas coisas à nossa volta, teremos uma atitude de respeito. Essa relação estreita se manifesta do ponto de vista etimológico, pois a raiz latina de respeito significa olhar duas vezes. Daí a conclusão de que o olhar atento é a essência mesma do respeito. E sabemos largamente que, quando alguém presta atenção maior nos outros e nas coisas, é comum comportar-se de maneira respeitosa.

A INDIFERENÇA

A moralidade está ligada à capacidade de ser consciente em relação à necessidade de cada situação e ao resultado das ações, se justo ou oportuno, a depender do momento. E a indiferença é precisamente a incapacidade de perceber a particularidade de uma situação. No fundo, e ainda que pareça o contrário, o indiferente não se dá conta de quando lhe exigem auxílio, prudência ou compreensão. Como ele poderá, então, agir moralmente?

UM MUNDO MAIS RESPEITOSO

Que o mundo seja distinto do que é depende, é claro, do que sejamos capazes de fazer: de fazer com relação a nós mesmos, com os demais e com tudo o que nos rodeia. Mas onde está a origem da mudança? Com o filósofo checo Jan Patocka aprendi que toda mudança autêntica procede da compreensão. Compreender é o primeiro passo para mudar de fato uma situação. Daí a conclusão de que não existe interesse dos defensores do status quo pelo ato de pensar. Devemos ser cautelosos ao falarmos de valores. Por vezes, há a impressão de que os valores se apresentam à nossa escolha como produtos em gôndolas de um supermercado da moral. Por isso, diante da referência excessiva aos valores, prefiro ressaltar a importância das atitudes morais, que, em definitivo, são a matriz do que chamamos de valores e o verdadeiro motor de nossas ações.

O SER E O TEMPO

Estou tão convicto de que o tema do respeito leva ao questionamento sobre o nosso modo de nos relacionar com o tempo que, depois de terminar meu ensaio sobre o respeito, passei a dedicar minhas reflexões àquele assunto. Além de mostrar que nossa experiência do tempo é feita de uma enorme riqueza, que exige ultrapassar a compreensão do tempo como uma mera dimensão quantitativa e homogênea, insisti que uma das chaves para descobrir os laços entre tempo e respeito consiste em entender a expressão “dar tempo”. Pode haver maior satisfação do que a de dar tempo? Em forma de aforismo, Ludwig Wittgenstein escreveu: “O cumprimento entre filósofos deveria ser: ?Dê um tempo!?” Sem dúvida, um ótimo conselho, não só para os filósofos como para qualquer um. Dar-se tempo quer dizer não se precipitar, não correr, não saltar etapas. Significa deixar passar o tempo necessário para que as coisas e os projetos amadureçam. O maior prazer é muito curioso, e difícil de medir. Dedicar uma tarde inteira para fazer companhia a uma pessoa não é a mesma coisa que estar com ela somente meia hora.

A VIDA QUE SE DÁ

O mais relevante é a maneira como se vive esse tempo, ou seja, a maneira de oferecê-lo ao outro. Esse é o prazer mais valioso, pois quem oferece o seu tempo se dá a si mesmo. Visto assim, o contrário de dar tempo não é acumulá-lo ou ganhá-lo, é o mesmo que não dá-lo. Quem nega a doação não o faz porque está guardando zelosamente o tempo para si mesmo, mas porque não o tem mais. Nesse sentido, a vida não é mensurável, ela é um paradoxo: quanto mais vida se oferece mais se tem.

UMA ÉTICA PARA O AMANHÃ

O importante é saber responder adequadamente à necessidade de cada circunstância. Está claro que a sociedade atual, configurada pela tecnologia e pelo consumismo, apresenta problemas de ordem moral que são novos e para os quais não adianta apenas inventar uma nova ética, mas observar quais atitudes e princípios de conduta são os mais adequados. Faz algumas décadas, Hans Jonas insistiu na idéia de responsabilidade e na promoção de uma ética da austeridade. Seu principal argumento era: se não atuarmos com mais moderação e responsabilidade, as conseqüências do dinamismo social serão catastróficas. Creio que, além de pensar nos efeitos das ações e insistir em atitudes sustentáveis, devemos introduzir a dimensão do respeito. Todos merecem o respeito. Nesse sentido, eu me atrevi a falar de uma ética do respeito.

A IDEOLOGIA DO PROGRESSO

Hoje o ser humano tem um poder enorme para mudar – e destruir – não só o mundo, mas a si mesmo. Este poder vem com uma imagem da humanidade como algo complexo, mas, no fundo, transparente e manipulável. Acredito que aí mora o grande perigo. Uma vez mais, tudo depende da compreensão. Não se trata de fazer oposição ao conhecimento científico nem às perspectivas abertas pela tecnologia, mas ir contra a ideologia reducionista sobre a ciência e a tecnologia. Essa ideologia apresenta a imagem de um mundo homogêneo, de uma realidade sem mistério, de um ser humano que constrói parte desse mundo desencantado. O perigo está nessa redução.

A INFINITA RIQUEZA

Por acaso, o nosso olhar não pode perceber novamente a infinita riqueza do mundo? Não somos capazes de atentar com um olhar renovado o mistério de todos os mistérios, que é a nossa própria existência? O segredo, o mistério do mundo, das coisas simples, dos homens, de mim mesmo, tudo isso nos obriga a adotar uma atitude respeitosa. É preciso ter respeito por aquilo que não logramos conhecer, por aquilo que se mantém como indevassável, por aquilo que constitui a autêntica densidade do outro e de mim mesmo.

Para mais informações, entre em contato com nossa assessoria de comunicação pelo e-mail ou pelo telefone (31) 3465-4500 (ramal 207).

← Voltar

Fechar

Pesquisar por autor, título, série, coleção ou ISBN.