Livro Paraó e Peba é exemplo de que é possível falar com crianças sobre temas complexos

Equipe - Publicado na categoria Entrevistas em 25/01/2022


Não é fácil falar com as crianças sobre determinados temas. Principalmente quando o assunto envolve um acontecimento real que afetou a vida de milhares de pessoas em todo o Brasil e cujas consequências, ainda hoje, ecoam em nossa memória. Mas essa foi a missão que duas talentosas artistas decidiram cumprir, com talento e sensibilidade.

Paraó e Peba é um livro infantil, escrito pela jornalista Mônica Bonilha, ilustrado pela artista multimídia Ana Lasevicius e lançado pela Editora Yellowfante, selo infantil do Grupo Autêntica. A obra conta, de maneira especial, a história de uma das maiores tragédias ambientais do país: o rompimento da Barragem de Brumadinho, em 2019, sem, contudo, nomeá-la.

Ao longo destas páginas, vamos conhecer dois peixinhos, grandes amigos, que se veem separados depois de ouvirem um estouro. O que acontece a partir daí, nós, adultos, sabemos. E as crianças também terão a oportunidade de saber, mas por uma outra ótica, para que consigam compreender a força da amizade, da determinação, da esperança e, o que é fundamental: a importância de se preservar o meio ambiente.

Em uma conversa com o Blog do Grupo Autêntica, a autora Mônica Bonilha contou sobre o processo de criação do livro, a escolha da tragédia como tema para um livro infantil e a importância de discutir essas questões, tão complexas, com as crianças.


Por que você escolheu a tragédia de Brumadinho como pano de fundo para a história de Paraó e Peba?
Na verdade, acredito que foi a tragédia ocorrida em Brumadinho que escolheu ser contada por duas piabas: o Paraó e a Peba.


Como aconteceu o processo de criação do livro?
Há três anos, assim que soubemos das dimensões daquela tragédia, diariamente, acompanhávamos a dor e tristeza daqueles que perderam seus queridos. Fui a Brumadinho algumas vezes para encontros com a comunidade porque era quase impossível morar em Belo Horizonte e não se envolver de alguma forma, buscar ajudar. Como sempre traduzo minhas ideias em aquarelas, comecei a pintar muitas cenas de Brumadinho, e a ideia de contar a história pela ótica dos peixes começou a se formar assim. Primeiro com imagens.


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Mônica Bonilha pintando algumas de suas aquarelas. Foto: Thaís Faria


Paraó e Peba trata de questões muito difíceis. Por que é importante falar sobre elas com as crianças?
Adoro contar histórias para crianças e adultos. Mas como contar uma história real tão trágica para crianças? Não é um conto ou uma lenda. É real. Acredito que elas compreendam a realidade dessa história mesmo sem entender o fato em si. Elas se relacionam com o sofrimento dos peixes que perderam sua casa, que sentiram o desespero de ver seu mundo, o rio, invadido por lama e com a busca deles naquela água turva.

Tudo isso é o mundo concreto, e a ilustração belíssima de Ana Lasevicius traz esta concretude. Ao transformar abacaxi em escama ou batatas em pedras, por exemplo, ela traz o cotidiano infantil para dentro de sua narrativa imagética.

É importante compartilhar histórias que pensamos ser complexas com as crianças porque elas vivem muitas complexidades e fazem interpretações do mundo que as rodeia, conseguem abraçar causas, se conectar com o sofrimento do outro e perceber que não estão sozinhas.


Como a história pode ajudar pais, cuidadores e professores a discutir esses temas com as crianças?
Li o livro para meu neto Isac, de cinco anos. Assim que terminei, ele apenas perguntou “vovó, esta história aconteceu de verdade, né?”. Nunca havia falado com ele sobre o rompimento da barragem da Mina Córrego de Feijão. Mas foi assim: ele percebeu uma verdade na história. O livro abre portas para conversar com as crianças sobre perda, sobre sustentabilidade, sobre superação, amizade e esperança.


Paraó e Peba deixa também uma mensagem sobre amizade, resiliência e recomeço. Foi sua ideia, desde o início, terminar a história com uma perspectiva mais otimista?
O livro narra a busca de Peba por seu amigo Paraó, que se perdeu no rio lamacento. Houve um momento que pensei que o Paraó poderia não ter sido encontrado ou poderia ter morrido. Mas fiquei pensando como narrar esta história para as crianças de Brumadinho – aquelas que haviam perdido familiares.

Geralmente, quando falamos de uma realidade e ela está distante de nós, temos a tendência de esquecer que a vítima vai ouvir ou vai ler o que escrevemos. Mas, sim, as crianças envolvidas de uma maneira ou outra com esta tragédia vão receber o livro. E eu quis levar uma mensagem de esperança para elas. Uma história de Brumadinho que também fala da resiliência de uma comunidade, da amizade e do recomeço.


Confira o video da autora Mônica Bonilha sobre o processo de criação do livro:

Conheça mais sobre o livro aqui

Tags:  Gutenberg,  tragédia,  brumadinho,  livro infantil,  educação infantil,  entrevista


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